Foi quando quis fumar um cigarro e o maço já tinha acabado me dirigi à máquina de café e à garrafa de Whisky que já tinha também acabado fui à caixa dos trocas que normalmente tenho junto às chaves da porta e o que lá tinha eram uns simples quarenta cêntimos resto da última bica tomada no café da esquina. Não valia a pena pegar nos cartões de débito e crédito pois esses tinham chegado ao fim do seu plafom. Subia as escadas (gente fina tem uma escadas em casa) e percorri toda a habitação. Nada havia a não ser os meus móveis de anos com recordações do passado. Recordações, umas de peças com anos que cada uma conta a sua história e fotografias do tempo que fui feliz na minha profissão e outras de pessoas que me foram queridas e de familiares que já não se encontram entre nós para me darem um abraço. Deu-me a fúria e retirei tudo o que me apoquentava com saudades e meti num baú onde escrevi uma etiqueta “Recordações que já não valem nada) e coloquei no topo das estantes do escritório em cima de uma outra que diz (Recordações de um passado).
Fiquei aliviado. De todas as recordações só restou uma em cima da secretária, a fotografia do meu filho antes da mão o ter levado.
Libertei-me das amaras do passado. Vou mudar de vida, tentar ser novamente eu. As portas do céu já se começam a abrir e antes que o Caronte me venha buscar para a outra margem não querendo voltar a traz porque como diz a cantiga “Ó Tempo volta p’ra traz” isso é impossível.
Gostava de ter coragem para fazer como o Frei Hermano da Câmara “entregar-me todo a cristo” mas não sou assim tão corajoso.
Os meus alicerces de vidas não se alteram assim sem mais nem menos, então, só me resta fazer uma reciclagem. Olhar para o espelho e gostar do que sou hoje. Ainda vai haver muita gente que goste de mim e reconheça os meus méritos.
Faço parte de uma geração por onde muitos não passaram. Visitei outros mundos, outras formas de estar na vida. Amei até à exaustão e por conveniência. Amei as coisas e as pessoas. Talvez por ter sido um tipo aberto para tudo na vida não fui compreendido por alguém que um dia por entrelinhas disse que tinha obrigações a reposta (porque acusou o toque) que tinha a sua própria família e eu não fazia parte dela.
Estou farto! Hoje resolvi libertar-me das amarras.
Eu sei que o telefone vai continuar a não tocar mas vou sentir-me bem com o meu novo espaço.
A minha nova roupa o meu novo loque até o Caronte me vier buscar.
Qualquer semelhança com factos reais é mera coincidência, ou não! O geral ultrapassa a ficção
Nelson Camacho D’Magoito
“Contos ao sabor da imaginação” (cn-299)
Para maiores de 18 anos
© Nelson Camacho
2016 (ao abrigo do código do direito de autor)
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